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Reflexão incompleta e precária sobre meu tempo na Residência Artística CASA B, e a exposição "Experiência B", no Museu Bispo do Rosario Arte Contemporânea

Fábio Carvalho
maio/2018

texto escrito após a residência CASA B, que antecedeu a exposição Almofadinhas | Experiência B, do grupo "Almofadinhas", do qual Fábio Carvalho, junto com Rick Rodrigues e Rodrigo Mogiz, é fundador.
 
Para mim, a experiência da residência começou bem antes do dia em que pela primeira vez passamos pela porta do Polo Experimental do Museu Bispo do Rosario Arte Contemporânea. Como bom CDF, já vinha há coisa de um mês antes deste dia mergulhando no universo de Arthur Bispo do Rosário, na sua vida e obra, lendo textos críticos, vendo fotos, vídeos, mas nada disso me preparou o bastante para o CHOQUE emocional que foi estar ali frente a frente, ou melhor, frente, trás, acima, por todos os lados, imerso, navegando, mergulhando quase em apneia, na vastidão de seus trabalhos, sem os recortes e direcionamentos museológicos de vê-los nas exposições. Vou precisar de toda uma vida para entender o que foi isso, que dias únicos foram aqueles! Houve momentos em que queria correr como uma criança na loja de brinquedos; em outros queria me encolher e chorar. Quase sempre queria abraçar as pessoas à minha volta. Devo ter falado mais alto e gesticulado mais que o de sempre.

Se isso já parecia TANTO naquele momento, quando estávamos já na reta final da montagem da exposição, quando "caiu a ficha" que em pouco tempo entregaríamos ao mundo uma exposição onde além da imensa felicidade de pela segunda vez expor com meus queridos amigos e parceiros Almofadinhas Rick Rodrigues e Rodrigo Mogiz, eu estaria lado a lado, ombro a ombro, com Arthur Bispo do Rosário, bateu excitação, bateu pânico, bateu euforia, uma sensação de responsabilidade gigante, de ter que estar a altura do que esse homem genial criou, medo de não corresponder a este desafio; por outro lado, uma felicidade imensa, uma sensação de que fui respeitado, ouvido, acolhido, de que eu mereço estar ali e agora. Enquanto escrevo minha cabeça fica em loop, revivendo estes momentos/sensações, e é difícil conseguir manter este relato coeso e coerente. Vai ser mesmo caótico! Eu avisei que seria uma reflexão precária e incompleta.

No lado artístico e intelectual, que privilégio poder trocar com a tão amorosa curadora Diana Kolker, sempre doce, aberta, delicada, irmã; que aprendizado observar nosso curador Almofadinha Ricardo Resende, com sua capacidade ímpar de liderar, decidir, apontar, cortar, inserir, mudar, provocar, sem nunca, jamais, impor, ignorar, pelo contrário, sempre acolhedor e com um respeito pelo artista e pela obra como deve ser, como muitos (eu incluído! quero um workshop!!) deveriam aprender. São tantas pessoas a agradecer, que prefiro dizer o mais sincero OBRIGADO a TODOS da equipe do Museu e do Polo que direta ou indiretamente me propiciaram esta vivência.

Porém, a minha maior e mais profunda gratidão vai para as pessoas que me tocaram mais fundo, e que talvez nem desconfiem que me viraram do avesso e me tornaram outro, um ser humano (espero) melhor: Ana, Arlindo, Clóvis, Luizinho, Patrícia, e tantos outros artistas e usuários do Polo Experimental. Eles me fizeram rever valores e certezas, me confrontaram com uma dor, e ainda assim, uma resiliência que eu não sei se eu conseguiria no lugar deles.

É preciso JÁ sair da bolha, parar com o teatro dos grandes salões que vivemos no circuito de arte em particular, e na vida de uma forma mais ampla, e nos embrenharmos na vida real, nas causas reais, nas dores reais, se queremos conhecer o afeto real, profundo, livre, isento. É preciso parar de atuar como artista, atuar como curador, crítico, galerista, etc., e sermos REAIS, honestos, sinceros, diretos, se queremos produzir um debate em arte que não seja apenas para dar conta de nossas vaidades, uma arte mais potente, que seja mais relevante para a vida, e não apenas para os catálogos e livros.

Urge voltarmos ou aprendermos a enxergar e RECONHECER o outro. Por mais que sempre falemos que o mundo é maior que nossos umbigos e iphones (iphone, ipad, i-tudo, eu, eu, acima de todos, eu), é preciso REALMENTE praticar, todos os dias, nossa capacidade de ouvir, ver, sentir, absorver, apreender, chorar, rir; ou seja, de verdade nos deixarmos permear pelo outro, nos deixarmos afetar (afetos! afetos!). Há muita dor, mas há também muito amor onde normalmente passamos ao largo e escolhemos ignorar.

E, de uma forma mais particular, tive a enorme felicidade de constatar que o Almofadinhas não é apenas um grupo que funciona à distância e no conforto do lar de cada um, movidos por algum interesse comum superficial. Passamos grudados 3 semanas, trabalhamos e conversamos (por vezes debates mais acalorados) intensamente por 2 semanas, de 12 a 16 horas por dia, em condições limitadas, praticamente sem internet e celular (o que foi maravilhoso para a criação de cada um, que foi muito além, tamanho o foco que desenvolvemos e concentração), e nunca o conflito, mesmo quando tínhamos posições divergentes em nossas conversas (empatia é a chave, minha gente!). Somos um grupo MUITO mais forte agora, depois dessa experiência.

Não termina aqui este relato (incompleto e precário). Segue pelo resto de minha vida e obra.

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segundo capítulo >>> O importante é o mergulho.

O artista plástico é geralmente um solitário, introspectivo, no que diz respeito à sua criação. E essa introspecção é fácil de compreender, uma vez que seu trabalho depende de uma investigação profunda de questões e valores pessoais. Mas ao mesmo tempo, um artista depende de constante estímulo para produzir sua obra. E como qualquer outra pessoa, o criador também constantemente se vê afundado em meio a rotinas e repetições da vida mais prática, o que pode ser um veneno para a criação. Então, como equilibrar a necessidade de reserva e silêncio, fugir da monotonia massacrante do dia a dia, e buscar novos estímulos para seu trabalho?

Naturalmente cada artista tem a sua fórmula para este problema. Como artista plástico acho que uma das maneiras mais ricas de conciliar espaço e tranquilidade para a criação, quebra da rotina e estímulo constante são as residências artísticas. Uma residência artística pode transformar e reorientar seu trabalho. Estar em outro local, outra realidade, onde tudo é novidade, tudo é informação fresquinha, a cada esquina, a cada minuto, pois nada daquilo faz parte do seu território ou da sua zona de conforto, te tira do óbvio, te leva a refletir muito além do habitual. Você precisa se adaptar, criar novas interfaces. Você apreende em pouco tempo muito mais do que apreenderia na sua rotina já bem conhecida de casa. E além disso, há o contato e as trocas com os outros artistas que estão lá ao mesmo tempo que você.

Em uma residência artística, o melhor é nunca tentar prever onde se vai chegar. O mais importante é caminhar livre, não ter medo das sombras e dúvidas do caminho, se arriscar, se lançar do penhasco, adentrar os túneis escuros, pois só assim você poderá ser novo, deixar que o desconhecido te atravesse, e partes fiquem para sempre reverberando em você por muito tempo, senão pela vida toda. Assim você acaba com um monte de novas estratégias e aparatos para atravessar o dia, e que irá abrir sua mente para novos pensamentos e idéias, o que é vital para uma pessoa que trabalha com a criatividade, e tudo isso, certamente, irá refletir sobre sua produção artística. Se já não faz sentido para a criação artística se manter preso às suas verdades e hábitos seguros, menos ainda em uma experiência como esta.
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